segunda-feira, 15 de julho de 2013

DISCURSO FEITO DURANTE INAUGURAÇÃO DA PEDRA FUNDAMENTAL EM 1922.

Homenagem antecipada da Academia Planaltinense de Letras ao Centenário da Pedra Fundamental, em 7 de setembro de 2022, durante o Bicentenário da Independência do Brasil

Discurso de Lançamento da Pedra Fundamental

Este discurso foi proferido em Planaltina (hoje no DF) pelo então Deputado Estadual Evangelino Meireles, goiano de Luziânia, no dia 7 de setembro de 1922, no momento em que aconteceu a Solenidade de Inauguração do obelisco que simbolizava o Compromisso do Governo Brasileiro com a construção de Brasília, em Goiás.

Comissionado pelos excelentíssimos senhores Presidentes da Câmara e do Senado Estaduais, e pelo Excelentíssimo Senhor Dr. Americano do Brasil, Deputado Federal, para representar, coletivamente, aquelas Casas do Congresso e, individualmente, este brilhante parlamentar goiano na grandiosa Solenidade do Assentamento da Pedra Fundamental da Futura Capital da República no Planalto Central do Brasil, marcada para hoje, pelo Decreto nº: 4.494 de dezoito de janeiro do corrente ano, venho, embora descoloridamente mas possuído de sincera boa vontade, desimcumbir-me da dignificadora tarefa que me foi confiada.
Filho desta Canaã radiosa onde cantam primaveras sem fim, nascido sob a proteção imensa deste céu paradisíaco, é me sumamente grato significar aqui o transbordar festivo do meu contentamento, e a jubilosa alegria de todos os goianos cuja vontade está politicamente cristalizada nos órgãos de sua Soberania, um dos quais , o Poder Legislativo, a que tenho a honra de pertencer, cabe-me representar.
O auspicioso fato de hoje é o encaminhamento natural de uma formosa ideia essencialmente brasileira; ele obedece como que a um determinismo político-social que há mais de um século nos vem conduzindo para a finalidade máxima da nossa ambição patriótica: a mudança da Sede do Governo para o ponto central do País a fim de que o Progresso se irradie do centro para a periferia e haja o aproveitamento desse hinterland arquipontentoso e pagão, reserva fabulosa da grandeza que nos espera em futuro cujo alvorecer começa a dar matizes de ouro e pérola ao horizonte da nossa Pátria extremecida; e também para que os Poderes Públicos, fora do barulhar das turbas, livres do anarquismo, das comichões interesseiras e do mercantilismo cosmopolita das grandes cidades, possam, com suavidade e bem aplicada sabedoria, cuidar das altas cogitações nacionais, rumando para  a perfeição, em busca do beneficiamento geral da Coletividade.
Essa é uma ideia antiga. A sua história é conhecida e, por isso, não precisa ser recontada. Sabemos que ela germinou no cérebro dos Inconfidentes Mineiros em 1789; que fervilhou na cabeça evangelizadora do jornalista Hipólito José da Costa e na cabeça de José Bonifácio (o Velho), Linhares, Joaquim Caetano, Porto Seguro e outros. Amparada na República pela vivência da Comissão dos Vinte e Um Notáveis que tinha à frente nesse particular, Lauro Müller e João Pinheiro, passou, com aplausos gerais, a ser lei, ocupando o artigo terceiro da nossa Carta Política. Floriano, o imortal Consolidador da República, precavido e  voluntarioso, deu começo ao cumprimento do dispositivo constitucional, mandando demarcar no Centro Geográfico do País, a área de 14.400 Km quadrados, destinada ao futuro Distrito Federal.
Houve, depois, uma síncope de quase trinta anos nas providências conducentes a esse elevado cometimento.
Ultimamente temos visto pontificar na Imprensa, batendo-se pela nobre causa, entre outros, os escritores Gomes Carmo, Henrique Silva, Azevedo Pimentel...; é a Sete de Setembro de 1921, os Deputados Americano do Brasil e Rodrigues Machado, este aqui também representado pelo meu digno colega Gelmires Reis, apresentaram à consideração da Câmara Federal, o Projeto nº: 680, mandando lançar a Pedra Basilar da Capital da União no Planalto, no meio do dia Sete de Setembro de 1922. Esse projeto, depois de conquistar os pareceres favoráveis das comissões de Justiça e de Finanças, foi aprovado pelo Congresso e converteu-se no Decreto nº: 4.494, citado.
É esta, Senhores, a determinação legislativa que hoje estamos cumprindo. Raiou, feliz, a aurora do grande dia. Já assistimos à festa gloriosa de um amanhecer no Planalto; agora sob a pompa tropical de um sol criador e benfazejo, ao ciclópico da Natureza agreste destas regiões privilegiadas de nossa terra, presenciamos as cerimônias desta hora alvissareira.
Sursum corda! Erguei-vos, corações goianos! Elevai-vos corações brasileiros! Entoemos hinos de glória à nossa Pátria querida e cânticos de louvor à ação patriótica do grande Epitácio Pessoa, cuja permanência na suprema Magistratura do País vai marcando uma época que ficará na História como o maior padrão de Civismo, de liberdade e de capacidade administrativa destes últimos tempos!
Assim, pois, Excelentíssimo Senhor Deputado Balduíno de Almeida, Vossa Excelência que possui já um altar no coração de cada goiano, pelo muito que tem feito em prol da penetração da via férrea nas terras de Bartolomeu Bueno, queira, com os seus dignos companheiros, e como Delegado do Excelentíssimo Senhor Presidente da República, receber as congratulações e as seguranças do mais profundo agradecimento do Povo de Goiás, que eu aqui trago, como Procurador do Congresso Estadual, e como Representante do Excelentíssimo Senhor Deputado Americano do Brasil, esse espírito iluminado e sadio, que tanto lustre tem dado à Bancada Goiana na Câmara Federal.
Essas congratulações eu as entendo ao ilustre Comissário do Excelentíssimo Coronel Eugênio Jardim, Benemérito Presidente do Estado {de Goiás}; aos Representantes do Exército e da Câmara Federal e todos os demais cavalheiros e excelentíssimas senhoras que neste momento abrilhantam e solenizam o importantíssimo acontecimento que nos trouxe a este famoso pedaço da terra brasileira.
Senhores! Concentremo-nos por um instante na contemplação deste nosso Brasil fidalgo e promissor! Passeemos o pensamento pelo seu passado de múltiplas e acidentais vitórias, pelo seu presente de assustadores progressos, e pelo futuro de formidáveis surtos de grandeza que lhe está reservada! Que vemos? Que apreendemos? Qual o resultado do nosso exame?
Vemos, sob as bênçãos da Constelação do Cruzeiro, a eclosão imensa de um povo que, aparelhado com as maiores possibilidades que se podem conceber, está destinado a assombrar o Mundo com o seu poderoso evolver em todos os galhos da atividade humana, em dias que não vêm longe!
Vemos uma Pátria que, acionada pela nobreza e sabedoria de seus filhos, marcha, com a vertiginosidade estonteadora dos astros vagabundos do Espaço, para um futuro de incalculáveis alcances, para uma era de bem-estar e riquezas!
Sete de Setembro! Eis-nos festejando pela centésima vez a data da nossa existência como Nação livre e constituída! Pela mente nos estão perpassando as figuras veneradas de Tiradentes, José Bonifácio, Pedro I, Gonçalves Ledo e tantos outros que se notabilizaram na construção da nossa Nacionalidade. E é hoje também que estamos dando começo à edificação da Futura Capital do País no coração de Goiás que, por sua vez, constitui as entranhas do Brasil! Dois fatos transcendentes: um cheio de sagradas evocações, outro verdejado das mais risonhas esperanças. No primeiro século decorrido, vimos civilizarem-se e engrandecerem-se as populações litorâneas; no segundo, que ora se inicia, veremos aproveitado todo o Interior gigantesco da Pátria, sendo a Cerimônia deste momento, o primeiro passo para a completa Integração da Unidade Nacional.
Eia! Brasileiros! Saudemos com entusiasmo a GRANDE DATA e deixemos cair nas planuras intérminas destas campinas viridentes o BRADO altissonante e vigoroso da nossa alma satisfeita e agradecida. Salve, oh Pátria idolatrada! Salve, oh Liberdade!!!


NOTA do historiador Xiko Mendes, membro da Academia de Letras e Artes do Planalto (sediada em Luziânia-GO) e da Academia Planaltinense de Letras (DF):
O texto que você acabou de ler faz parte do livro “Pela Terra Goiana”, autoria de Americano do Brasil, e que fora transcrito para as páginas 15 a 18 do livro “Apologia de Brasília”, organizado por José Dilermando Meireles, com a colaboração de Joaquim Gilberto, entre outros, e com edição patrocinada pela Prefeitura Municipal de Luziânia-GO.
O livro Apologia de Brasília foi publicado no início dos anos 1960 no contexto histórico da construção e inauguração de Brasília. E nunca mais foi reeditado. Agradecemos, aqui, ao já falecido historiador Paulo Bertran, que nos presenteou com um exemplar, todo amarelado, dessa raríssima obra prima do acervo nacional. O Deputado Estadual Evangelino Meireles, autor do Discurso acima citado, era goiano e nasceu em Luziânia 10 de fevereiro de 1882, segundo nos informa Antônio Pimentel, em seu livro “Fragmentos Antológicos dos Autodidatas de Santa Luzia” (Luziânia-GO, Edição do autor, 1992, p. 29-30).
Evangelino Meireles morreu precocemente aos 40 anos de idade, em 1º de dezembro de 1922, três meses após proferir o discurso que ora republicamos. Entre suas grandes realizações, Evangelino Meireles foi autor do projeto da estrada de rodagem ligando Vianópolis a Luziânia, Planaltina e Formosa durante a gestão do Governador João Alves de Castro. Foi também poeta e jornalista. Fundou em 6 de agosto de 1910 o jornal “O Planalto” que circulou até 10/11 de 1915, totalizando 186 edições. E a partir de 1919, com auxílio do historiador Gelmires Reis, iniciou a publicação do famoso “Almanaque de Santa Luzia”, atual Luziânia, sua terra natal.

Planaltina vista pelo Escritor Guimarães Rosa

Xiko Mendes (da APL)

Como se sabe, o escritor mineiro Guimarães Rosa (1908-1967), assim como Euclides da Cunha, Afonso Arinos e Bernardo Elis, é um dos magos intérpretes do Brasil profundo ou sertão indômito. Autor de obras conhecidas mundialmente como “Sagarana” e “Noites do Sertão”, Rosa é, sobretudo, conhecido pelo seu romance “Grande Sertão: Veredas”, publicado em 1956, ano em que o Presidente JK iniciou a construção de Brasília, modernizando o sertão ou “sertanejando” a modernidade para o interior. Rosa assim se refere a Planaltina antes de Brasília:
Gente boa, a do Ão, lugar de lugar. Senhor Zosímo, o fazendeiro goiano, desarmou desdém, reconhecendo que se podia gostar demais dali. Esse tinha feito a Soropita, a sério, uma proposta: berganhar aquilo por sua grande fazenda, dele, cinco tantos maior, em Goiás, fundo de rumo de Planaltina. (...). O Campo Frio, se chamava. (...). Senhor Zosímo era homem positivo, tinha sido de tudo, até amansador de cavalos, peão. (...). era mineiro também, arranjara aquela fazenda em Goiás por simpleza do destino” (In: Rosa, Guimarães. Noites do Sertão, 9ª ed., Rj, Editora Nova Fronteira, 2001, p. 41-42).

Esse texto é um trecho do conto “Lão-Dalalão ou Dão-Lalalão”. E precisaríamos fazer um rigoroso estudo roseano de arqueologia fundiária para localizarmos a fazenda Campo Frio, nos domínios do atual Distrito Federal, mas certo é que ficamos orgulhosos dessa citação em obra que exalta o talento literário de Guimarães Rosa, escritor que é Patrono da Cadeira nº: 32 de nossa Academia Planaltinense de Letras (APL).